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O que o  U2, as doações e o Coronavírus revelam sobre nós

Mais de R$ 2,2 bilhões foram doados até o momento por empresas, fundações e celebridades, para ajudar a sociedade brasileira a enfrentar a crise provocada pelo coronavírus, segundo o site monitordasdoacoes [1].

Olhando somente para as doações dos bancos, vemos que a Fundação Itaú Social se destaca com uma doação de R$ 150 milhões. Em conjunto com os bancos Bradesco e o Santander, o Itaú doou ainda outros R$ 80 milhões. O Bradesco doou mais R$16,66 milhões, além de R$ 5 milhões através da Bradesco Seguros.  Vemos ainda que o digital Nubank doou R$ 40 milhões e o Safra R$ 30 milhões.  E hoje o Banco Itaú anunciou mais uma doação , no valor  recorde de R$ 1 bilhão. Diante de tudo isso, não há outra palavra a ser dita a não ser: sensacional! São mais de R$ 1,3 bilhão doados por bancos em poucas semanas!

Doações são voluntárias. Isso faz com que elas ajudem a construir a reputação dessas instituições perante toda a sociedade.

No entanto, como cidadãos, há um outro lado que devemos encarar e fazer algo a respeito.

Juntos, como sociedade, criamos regras que permitem que essas instituições – os bancos brasileiros – estejam entre as mais lucrativas do mundo. Segundo o jornal Valor Econômico, os quatro maiores bancos de capital aberto do país — Itaú Unibanco, Banco do Brasil (BB), Bradesco e Santander — tiveram lucro líquido de R$ 86,6 bilhões somente em 2019, um crescimento de 18,4% em comparação com o ano anterior. Lembremos que em 2018 e 2019 o PIB brasileiro cresceu 1,1% ao ano, segundo o Ipea.

Nós também criamos ou aceitamos as regras que resultam hoje em 39 milhões de crianças e adolescentes dependentes da merenda escolar para se alimentar e não adoecer por fome, e que vivem com adultos em dificuldades extremas. Resultam também em  54 milhões de brasileiros com renda média mensal  menor que um salário mínimo – empregados com carteira assinada ou na informalidade. Ou ainda em outros 10 milhões que vivem com apenas R$ 51 por mês. Todas essas pessoas convivem conosco diariamente. Estão fazendo a faxina dos lugares aonde vamos, limpando nossas ruas, trabalhando nos hospitais de que precisamos, estão plantando e cozinhando nossa comida.

Assim, além de concluir que R$ 1,3 bilhão não representa muito, se comparado ao lucro dos acionistas dos bancos mencionados (e significa menos ainda se pensarmos que a banda U2, sozinha, doou 10 milhões de euros -cerca de R$ 50 milhões de reais– para a Irlanda, que tem somente 5 milhões de habitantes), concluímos também que, diante dessa crise, que fez nossa realidade ficar ainda mais evidente, devíamos mudar as regras do jogo na sociedade brasileira, para acabar com as moradias de baixa qualidade, com a fome e fazer com que a população que vive de luz e doações neste país seja parte de nosso passado. O mais rapidamente possível.

Todos os cidadãos, mas também, e talvez especialmente, as empresas têm um papel fundamental para mudar as regras desse jogo.

Como? Temos certeza que, com tantos recursos e pessoas inteligentes ao redor das empresas, vamos achar o caminho. Que esperamos seja rápido, muito rápido. Antes da próxima crise humanitária.

Texto: Nelmara Arbex, CEO da Arbex & Company

[1] Fazendo uma pesquisa rápida, logo percebemos que os totais do site que moniora as doações estão longe de refletir a realidade,  muito mais generosa, já que o banco de iniciativas selecionadas pela Arbex&Company  registra outras doações que não estão no site.

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